![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgHzDZ5qpF6M93-EdlWF6R05Zpqc0W54p4Gr8uGyEbAktoeV1GiLTy15mxiwDTY0Ecgtth2c6H58jXxMY3STr5sdMbzezWSUjAwQTs4bCi_iLmUFJWvwcA_RVLd-AQa2OlTGeX_iE27V-4/s400/escombros.jpg)
Defronte à minha porta estão a construir
Um prédio enorme.
Observo a massa de concreto e os tijolos.
Nada os dissolve.
Chega a chuva e chuvisca a construção
Com pingos largos.
O trabalho de um dia foi-se, foi-se em vão...
Está em pedaços.
Amanhã, quando virem os estragos,
Construirão de novo.
O prédio se erguerá sem embaraços.
E possuirá um rosto.
Mas vem o temporal fazer visita
E embebedar as plantas;
Rega-as quando medita.
Depois o pó das ferramentas ele arranca.
A máquina mistura areia e cimento
Com o suor de quem lhe serve;
Os pássaros se espantam: dela o movimento
Mais parece um vulcão que ferve.
De manhãzinha, inicia-se a labuta:
Sons estranhos circulam pelo pátio;
A orquestra bate-estaca soa funda
No silêncio sonífero do sábado.
Quando penso que a obra se prepara
Para almoçar descanso de uma hora,
O vento traz uma batida magra,
Sinal que a ferramenta inda tem força.
Dois jovens, como que magnetizados
Pela força metálica da orquestra,
Engolem poeira e expelem cacos
Da construção deles moléstia.
Da janela eu os vejo: um é magro e moreno;
O outro, pouco mais velho.
O primeiro se esfalfa com o cimento;
O outro, com o martelo.
Descansam aos domingos. A obra fica só.
O que fazem no dia de descanso?
Decerto, limpos do suor,
Encharcam-se com vinho. Ou molham-se de pranto.
Materiais de construção: pirâmides
De areia, montanhas de brita;
A formão, ferramenta em seus trâmites,
Aplaina a massa e na parede a espirra.
A pá e o aprumo, as peças de madeira,
A enxada, a picareta, a linha mestra,
Segunda, terça, quarta, quinta, sexta,
Todos os dias que o trabalho adestra;
Na noite do silêncio merecido,
É-me triste observar esse contorno informe,
Abandonada, como a um proscrito
Que se perdeu na treva e nunca teve nome.
A construção é o ato, nunca é o fim.
O fim da construção é abstrato.
A obra continua, mesmo se
O temporal seguir-lhe o rastro.
Perdizes, agosto de 2009
Nenhum comentário:
Postar um comentário