"A liberdade é a possibilidade do isolamento. És livre se podes afastar-te dos homens, sem que te obrigue a procurá-los a necessidade do dinheiro, ou a necessidade gregária, ou o amor, ou a glória, ou a curiosidade, que no silêncio e na solidão não podem ter alimento. Se te é impossível viver só, nasceste escravo. Podes ter todas as grandezas do espírito, todas da alma: és um escravo nobre, ou um servo inteligente: não és livre. E não está contigo a tragédia, porque a tragédia de nasceres assim não é contigo, mas do destino para si somente. Ai de ti, porém, se a opressão da vida, ela própria, te força a seres escravo. Ai de ti se, tendo nascido liberto, capaz de te bastares e de te separares, a penúria te força a conviveres. Essa, sim, é a tua tragédia, e a que trazes contigo.
Nascer liberto é a maior grandeza do homem, o que faz o ermitão humilde superior aos reis, e aos deuses mesmo, que se bastam pela força, mas não pelo desprezo dela.
A morte é uma libertação porque morrer é não precisar de outrem. O pobre escravo vê-se livre à força dos seus prazeres, das suas mágoas, da sua vida desejada e contínua. Vê-se livre o rei dos seus domínios, que não queria deixar. As que espalharam amor vêem-se livres dos triunfos que adoram. Os que venceram vêem-se livres das vitórias para que a sua vida se fadou.” (Bernardo Soares)

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Estou cansado, é verdade...
Quero ter sono e dormir
Para poder prosseguir
E nunca sentir saudade

Do sono brando que não tive
Quando podia descansar.
A vida é o drástico declive
Do Sonho arremessado no ar.

Tenho fé no que transcende
A minha Alma decepada.
Existi como um duende
À procura de uma fada.

Perdi o bilhete de passagem
Que possuía para a vida...
Não desisti, porém, da viagem:
Só me cansei desta guarida.

Existir é esperar a morte certa.
O homem que a espera enfim desperta
E vê que não viveu, pois esperava...

De tudo que fiz na vida
Dispendi muito trabalho.
Levei tudo de vencida
E esta batalha aguerrida
Tornou-me um homem falho.

As luzes que se apagam
Não mais se acenderão.
Vagam com elas despojos
Filhos da Escuridão.

Basta amar quem nos ama?
Não há amor entre feras.
O Amor sempre reclama
Duas mil primaveras.

Estou cansado, é verdade...
Quero ter sono e dormir
no alvo seio do devir.

O Futuro é a minha Divindade.

Araxá, em 2009.

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