"A liberdade é a possibilidade do isolamento. És livre se podes afastar-te dos homens, sem que te obrigue a procurá-los a necessidade do dinheiro, ou a necessidade gregária, ou o amor, ou a glória, ou a curiosidade, que no silêncio e na solidão não podem ter alimento. Se te é impossível viver só, nasceste escravo. Podes ter todas as grandezas do espírito, todas da alma: és um escravo nobre, ou um servo inteligente: não és livre. E não está contigo a tragédia, porque a tragédia de nasceres assim não é contigo, mas do destino para si somente. Ai de ti, porém, se a opressão da vida, ela própria, te força a seres escravo. Ai de ti se, tendo nascido liberto, capaz de te bastares e de te separares, a penúria te força a conviveres. Essa, sim, é a tua tragédia, e a que trazes contigo.
Nascer liberto é a maior grandeza do homem, o que faz o ermitão humilde superior aos reis, e aos deuses mesmo, que se bastam pela força, mas não pelo desprezo dela.
A morte é uma libertação porque morrer é não precisar de outrem. O pobre escravo vê-se livre à força dos seus prazeres, das suas mágoas, da sua vida desejada e contínua. Vê-se livre o rei dos seus domínios, que não queria deixar. As que espalharam amor vêem-se livres dos triunfos que adoram. Os que venceram vêem-se livres das vitórias para que a sua vida se fadou.” (Bernardo Soares)

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

O que ficou no caminho

Tristis eris si solus eris
OVÍDIO

Caminha cabisbaixo entre resquícios
De uma vida esgotada em artifícios
Que o arrastam, lentamente, à indigência;
Está sozinho na árdua atividade
De procurar no mundo a liberdade
E traduzir na Arte a própria Essência.

Segue de olhos fechados, meditando
À nulidade trágica, ao desmando
Dos desejos do homem, incoerentes;
Pensa na concepção de um paralelo,
Uma terra divina, um anelo
Onde possa plantar suas sementes.

Ah! Como desejara estar contente
E passar pela vida inutilmente
Numa existência quase religiosa...
Mas o Poeta vê o invisível
E retorna, senhor de um mundo incrível
Onde a lua é mais triste e nebulosa...

Carrega a sina de um destino aziago:
Procurar no humano gesto o afago
Que lhe complete a alma e o sentido;
E, numa tarde harmoniosa , crer -
Viver é o exercício de esquecer
O Sonho que jamais será esquecido.
Araxá, fevereiro de 2007.

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